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Penso que o conceito freudiano mais adequado para se
abordar o tema do racismo a partir da teoria psicanalítica seja o narcisismo das pequenas diferenças. Freud criou este conceito para tentar
entender a repulsa do povo alemão pelo povo judeu. Sendo, ele próprio, um judeu
austríaco (que precisou se exilar nos Estados Unidos com a chegada de Hitler ao
poder), Freud tinha razões pessoais – para além de sua curiosidade
investigativa – para tentar entender o injustificável preconceito da população
alemã pelos judeus que viviam no país, como cidadãos alemães, com o mesmo
direito dos alemães não judeus. Suas reflexões o levaram a concluir que aqueles
que repelimos, ou odiamos, não são os 100% estranhos a nós. Não são os povos
exóticos, por exemplo – com culturas incompreensíveis, línguas que não
dominamos, rituais, cores de pele, religiões etc – que nos ameaçam. Aqueles que
nos ameaçam são exatamente os que, não sendo idênticos a nós, apresentam tantas
afinidades culturais, ou linguísticas, ou fenotípicas, a ponto de não
conseguirmos nos diferenciar deles de modo a garantir alguma segurança identitária. Mas será que isso existe? Não somos nós,
divididos pela existência do inconsciente, incapazes de formar um todo
indivisível? Não somos, cada um de nós, divididos pelo estranho que nos habita?
Talvez a divisão subjetiva seja tão difícil de suportar que a necessidade de
negá-la produza, inconscientemente, a raiz das discriminações racistas.
No Brasil, por exemplo, costumamos valorizar muito os representantes de raças
“brancas” (ninguém é branco, certo?
Somos rosados, beges, amarelados, marrons…) que nos garantam a descendência
europeia-portuguesa. Durante 300 anos trouxemos africanos escravizados para se
encarregarem do trabalho pesado nas fazendas e nas cidades. Deles herdamos o
melhor de nossa música, de nossa culinária, de muitas práticas culturais e
mesmo de nosso sincretismo religioso. No entanto… uma parte numerosa da
população brasileira é racista. Não concedemos aos escravos recém libertos nem
um pedaço de terra onde pudessem plantar para recomeçar suas vidas. Se uma
parte desses descendentes de africanos teve a sorte de conseguir trabalho,
muitos ficaram desempregados, vagando pelas ruas, vivendo de pequenos serviços,
passando necessidade. As elites passaram a associar os descendentes de escravos
com… vagabundos. A eles devemos o samba, o candomblé, o vatapá, o caruru, o
gingado, a capoeira… Uma parcela considerável da cultura da qual nos orgulhamos
e que encanta os visitantes estrangeiros. Mas não queremos nos identificar com
eles.
Pretendo abordar o racismo a partir dessas duas perspectivas conflitantes: a
rejeição dos descendentes de escravos que ajudaram a construir o Brasil, mas
que desprezamos como inferiores; o fascínio em relação à cultura que esses
mesmos descendentes de escravos trouxeram para cá, e que se expandiu em muitas
formas diferentes – samba, candomblé, culinária, carnaval…
Qual a operação psíquica acionada para conciliar essas duas correntes de afeto
(amor e rejeição) e de pensamento (admiração e preconceito) em relação aos
brasileiros de pele negra?
quinta-feira | dia 02
de fevereiro
horário | 19h às 21h
dirigido
a psicólogos, psiquiatras, psicanalistas, profissionais das áreas da saúde,
alunos e ex-alunos do Curso de Formação em Psicanálise
preço
até o dia 23/01/23 | R$ 200,00
após o dia 23/01/23 | R$ 230,00